Entenda a tragédia de Minas Gerais

Toda tragédia só ocorre por uma sucessão de erros e omissões. Essa "sequência" é o agente desencadeador. Tentaremos explicar sobre esta tragédia.

O rompimento da barragem de Fundão, dia 5 de novembro na unidade industrial de Germano, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto (cerca de 100 km de Belo Horizonte), provocou uma onda de lama que devastou distritos próximos. O mais atingido foi Bento Rodrigues. Há relatos de desaparecidos, e o número total de mortes ainda é desconhecido. Inicialmente, a mineradora Samarco havia afirmado que duas barragens haviam se rompido, de Fundão e Santarém. No dia 16 de novembro, a Samarco confirmou que apenas a barragem de Fundão se rompeu.



Veja a seguir perguntas e respostas sobre o que foi considerado o maior desastre ambiental da história de MG: 

O ROMPIMENTO


De quem são as barragens? 
A mineradora Samarco é a empresa que beneficia o minério na região, aumentando seu teor de ferro, para depois exportar a outros países. Fundada em 1977, ela é uma empresa de capital fechado controlada por duas acionistas, ou donas: a anglo-australiana BHP Billiton Brasil Ltda. e a brasileira Vale S.A. Cada uma controla metade. Os rejeitos dessa exploração eram estocados pelas barragens que se romperam. 

O que provocou o rompimento? 
As causas ainda estão sendo investigadas. Inicialmente, a Samarco disse ter registrado dois pequenos tremores na área duas horas antes do rompimento. O Observatório Sismológico da Universidade de Brasília registrou dois tremores próximos ao local, de baixa magnitude. “Uma das coisas ainda em discussão é se esse é um evento natural ou desencadeado pelos reservatórios”, afirmou George Sand, chefe da unidade. Não chovia no momento do rompimento. Um engenheiro da Samarco afirmou que uma vistoria não detectou risco no local. Mas um laudo obtido pelo Jornal da Globo mostra que já se sabia do risco. "O contato entre a pilha de rejeitos e a barragem não é recomendado por causa do risco de desestabilização do maciço da pilha e da potencialização de processos erosivos", diz o documento. Para o Ministério Público, isso mostra que houve "negligência" da empresa. A Feam (Fundação Estadual de Meio Ambiente) declarou que chegou a recomendar a necessidade de se fazer reparos na estrutura da barragem de Fundão. 

Quantas pessoas foram afetadas?
O distrito de Bento Rodrigues foi destruído e centenas de pessoas ficaram desabrigadas. A lama alcançou outros distritos de Mariana, como Águas Claras, Ponte do Gama, Paracatu e Pedras, além da cidade de Barra Longa. Até o domingo (15), sete mortos haviam sido identificados e 18 pessoas estavam desaparecidas. Outros dois corpos foram encontrados e aguardavam identificação. Os rejeitos foram levados pelo Rio Doce, afetando ainda dezenas de cidades na Região Leste de Minas Gerais até o Espírito Santo, com a falta de água potável. 

Quantos distritos foram afetados? 
A onda de lama continua a atingir outras comunidades, como Paracatu de Baixo e Camargos, e as cidades de Barra Longa, Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado e cidades do Leste de Minas, como Governador Valadares. A lama também chegou ao Espírito Santo, levada pelo Rio Doce, afetando Regência, Linhares, Baixo Gandu e Colatina. 

Há risco de outra barragem se romper? 
No local onde opera a Samarco, ainda existe a barragem de Germano, a maior entre as três que compunham o sistema de rejeitos. Em razão do risco de rompimento também dessa barragem, as buscas foram replanejadas na quarta (11) por medida de segurança. A barragem de Santarém, que inicialmente foi considerada como rompida, ainda armazena rejeito, também é monitorada e vai passar por intervenções preventivas. A Samarco informou que iria realizar intervenções nas “estruturas remanescentes das áreas de barragens”, para proporcionar mais estabilidade e prevenir “problemas futuros”. O Corpo de Bombeiros divulgou a existência de uma trinca nessa barragem.


DANOS AO MEIO AMBIENTE 


A lama é tóxica? 
Segundo o geólogo Luiz Paniago Neves, coordenador de fiscalização de pesquisa mineral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão responsável pela fiscalização de barragens de rejeitos, o rejeito de minério de ferro é classificado como inerte, ou seja, inofensivo. Se ele chegar ao leito de um rio, por exemplo, a água poderá ficar turva, ocorrerá uma sedimentação, mas o consumo da água não terá impacto na saúde. Apesar disso, ainda não houve nenhuma análise específica dos rejeitos despejados pelas barragens rompidas. Em Governador Valadares, uma das cidades banhadas pelo Rio Doce, o diretor geral do serviço autônomo de água e esgoto, Omir Quintino, disse que a água coletada para análise apresentou alto índice de ferro, o que inviabiliza o tratamento, além de grande quantidade de mercúrio, que é muito tóxico. Já a Samarco diz que não havia elementos tóxicos no material. 

Qual a quantidade de lama levada aos distritos? 
Segundo o Ibama, estima-se o lançamento de 50 milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração, o suficiente para encher 20 mil piscinas olímpicas, composto principalmente por óxido de ferro e sílica (areia). 

O que essa lama provoca?
Segundo a coordenadora do núcleo de emergências do Ibama de Minas Gerais, Ubaldina da Costa Isaac, a lama atingiu uma extensão de 80 km do leito d’água na região. Uma das consequências é o assoreamento, ou seja, o acúmulo de sedimentos na calha do rio, causando impactos socioeconômicos e ambientais. Conforme o Ibama, houve alterações nos padrões de qualidade da água (turbidez, sólidos em suspensão e teor de ferro). Um dos impactos é a mortandade de animais, terrestres e aquáticos, por asfixia. Já no Rio Doce, onde chega mais diluída, a morte de peixes ocorre pelo sistema respiratório, complementa o instituto. 

Qual o prejuízo do desastre? 
O prefeito de Mariana, Duarte Júnior, disse que o prejuízo com o rompimento das barragens é de ao menos R$ 100 milhões, incluindo perdas de infraestrutura, dano ambiental, pontes levadas e escolas que foram destruídas. O número é um levantamento preliminar feito pela Secretaria de Obras da cidade. 


SEGURANÇA E PREVENÇÃO 


A barragem era considerada segura? 
De acordo com o Departamento Nacional de Produção Mineral, a barragem de Fundão está classificada como de baixo risco, pelo bom monitoramento e documentação em dia. Mas por estar situada em região com alta densidade populacional, sua classificação do dano potencial associado, ou seja, da gravidade do que poderia acontecer em caso de acidente, é alto. 

Quem concedeu a licença para a mineradora? 
O órgão licenciador é a Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais (Feam/MG), que deverá apurar as responsabilidades e adotar as medidas previstas na legislação. Ele é vinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). 

A mineradora continuará funcionando? 
A Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais informou que todas as atividades da Samarco Mineradora estão suspensas e a empresa não poderá operar até que repare os danos causados. 

Quais as obrigações ambientais de uma empresa que explora minério? 
Como exercem uma atividade de risco, as mineradoras devem seguir normas técnicas de segurança e estão sujeitas à legislação ambiental e licenciamento ambiental. Uma das obrigações é ter um plano de recuperação de áreas degradadas pela atividade. 

A mineradora usou um alarme sonoro para alertar sobre o rompimento? 
Não. A assessoria da Samarco Mineração disse que nunca recebeu nenhum pedido dos moradores para que houvesse algum alarme ou sirene. E que assim que aconteceram esses rompimentos das barragens, entrou com um plano emergencial em ação e que chegou a ligar para os moradores, para que eles saíssem de suas casas. Disse também que o plano seguiu a legislação brasileira e as boas práticas internacionais. 

A obrigatoriedade do alerta sonoro está prevista na Convenção no 176 e a Recomendação no 183 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Segurança e Saúde nas Minas, que está em vigor no país graças ao Decreto 6.270/2007.